Obras

Caçador (Série Figuras de Convite) (1996)
Azulejo policromo
168 x 140 cm

As obras “Gato”, “Mordomo”, “Caçador” e “Cozinheiro” fazem parte da Série “Figuras de Convite”.

As figuras de convite são representações de personagens à escala natural, realizadas em azulejos, de um modo geral recortados, e que eram colocadas nas entradas dos edifícios, numa atitude de cortesia, guarda ou orientação no espaço a que éramos convidados a aceder.

A origem primeira em Portugal destas singulares figuras de convite poder-se-á encontrar por volta de 1707-1708 em Willemsz van der Kloet (1666-1747) na sua manufactura de Amesterdão para o Santuário de Nossa Senhora da Nazaré.

Em finais do século XVII, perante uma produção local ingénua e artesanal, os azulejos holandeses impuseram-se em Portugal pela perfeição técnica, renovação iconográfica e rigor académico da pintura, constituindo um fenómeno de moda por melhor corresponder ao status da sociedade portuguesa de então, que se abria decididamente ao gosto cosmopolita e europeu. Chegara o momento de pintores portugueses, com formação académica e conhecimentos de desenho e perspectiva, alguns deles decoradores de tectos, trabalharem na pintura de painéis de azulejos que, por vezes, assinavam e datavam. Traziam assim para os ambientes palacianos e religiosos, com grande largueza no tratamento dos temas, cenas de caçadas e cortesãs, episódios da vida de Cristo e dos Santos. As figuras de convite portuguesas são importantes marcações cenográficas nos espaços quotidianos, personagens eloquentes do teatro da vida, enquadradas nas encenações grandiloquentes, apelo à participação do espectador, através dos sentidos, como só a imaginação do Barroco produziu.

Todo o século XVIII e primeira metade do séc. XIX é percorrido por estas presenças que nos interpelam, permitindo reconhecer aí os gostos entre o barroco joanino e o rococó pombalino. Como marca identitária da cultura artística portuguesa, a figura de convite é retomada no século XX, dentro de um gosto modernista.

Caberá contudo a Júlio Pomar trazer à contemporaneidade outras figuras de convite, agora com vocação de retrato e comentário sarcástico ou caricatural. Com citação da retórica convencional do género, logo conhecendo bem este património da cultura portuguesa. O pintor liberta-as através do desenho impulsivo e de um humor assertivo e lúcido que lhe são tão próprios, oferecendo-nos personagens / clowns que se exibem jocosa e ironicamente, amantes do disparate, nisso lembrando o melhor da estrutura mental dos portugueses, vertida na Azulejaria portuguesa do século XVII em registos extraordinários como, por exemplo, as macacarias do Palácio Fronteira em Lisboa e os vários registos expostos no Museu Nacional do Azulejo.

João Castel-Branco Pereira (2009)

In Catálogo da exposição “Júlio Pomar. Figuras de Convite” realizada na Casa Rural da Vila Romana de Milreu com produção de Galeria Ratton (de 25 de Setembro de 2009 a 3 de Janeiro de 2010).

Cortesia do artista e Galeria Ratton

 

 

 

 

 

 

 

local: “Avanços e recuos da globalização” EXPOSIÇÃO PRINCIPAL,Museu de Arte de Macau
16/07/2021~15/08/2021